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Caixa de Areia [2016]


Objetos [10]

Caixa de vidro, fotografia e areia | 6 x 6 x 4cm

Caixa de Areia

Como provar o passar do tempo? O corpo vomita tudo o que consome em rugas, excrementos, lágrimas e marcas. Não precisei estender o olhar muito além dos meus ombros. Cada centímetro meu trazia questionamentos de sexualidade, gênero, invasão e identidade. Estando ali qualquer um veria.

 

Não houve outro motivo que não a curiosidade de invadir-me. Pele à dentro.

 

O encontro com o outro é inevitável. Nada me difere de você. De fato, não era exatamente de você que falava quando me percebi perdida?

 

Junto com a insistência de que algum trauma deveria justificar a minha plasticidade sexual veio uma revisitação ao episódio do abuso. Naturalizado, não mencionado e depositado como sujeira por entre as unhas. Para ver o que passava ali, era preciso esforço, ainda que mínimo. Algo naquele corpo deveria estar falando, se não aos gritos, aos cochichos. 

 

Quem eu poderia ser se não fruto daquela memória?

 

Mas a memória orgânica falha. Resta-me preencher suas lacunas e recriar o passado como me convém. Convido a pensar a forma como os fatos e provas podem ou não nos castrar a função inventiva da vida. Já que de certa forma os fatos são também o ponto de partida para criação. Até aí, o passado já está posto.

 

E se pensássemos um corpo sem memória? Que passado inventaríamos para ele? Que marcas teria?  Que idade teria? A que lugar pertenceria? Que solo pisaria? Que gosto teria?

 

Refletindo sobre essas questões proponho construir uma obra interativa que ofereça ao espectador duas saídas. Frente a ele uma caixa de vidro incolor, transparente, com uma imagem ao fundo. Sobre a imagem, areia. Cabe ao espectador optar por sujar-se para acessar uma memória em sua plenitude ou limitar-se a observar-la parcialmente de longe. Ambas possibilidades são válidas e podem acessar as lacunas da memória orgânica. O que provavelmente será diferente, e aposto nisso, são as criações ao convocarem suas memórias inventivas, já que a experiência sensorial é distinta e múltipla.

 

Dou-lhes apenas um rosto.

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